Rivais (2024)

Esse Eu Vi
3 min readApr 16, 2024

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Guadagnino dirige com ímpeto e excitação filme sobre anseios conflitantes

Rivais apresenta Zendaya como Tashi Duncan, uma ex-prodígio do tênis que se tornou treinadora e uma força da natureza que não pede desculpas por sua maneira de jogar dentro e fora da quadra. Casada com Art Donaldson (Mike Faist), um campeão que atualmente está numa série de derrotas, a estratégia de Tashi para a redenção do marido toma um rumo surpreendente quando ele precisa enfrentar o fracassado Patrick (Josh O’Connor) — seu antigo melhor amigo e ex-namorado de Tashi. À medida que seus passados ​​e presentes colidem e as tensões aumentam, Tashi deve se perguntar: quanto custará para vencer?

O diretor italiano Luca Guadagnino é um dos mais coesos cineastas da atualidade. Por mais diferentes que sejam as temáticas de suas produções anteriores a tensão e obsessão são temas recorrentes apresentados de maneiras hora mais explícitas, hora mais camufladas no subtexto. Rivais é um que é todo construído em cima desses dois pilares e eles são explorados visualmente e narrativamente sob tantas perspectivas e com tanta fluidez as mais de duas horas de duras de duração passam imperceptíveis.

Não sou o maior fã de filmes esportivos por mais motivadoras que sejam as histórias, eles sempre desembocam no mesmo lugar comum de superação ou vitória esperada que metaforiza uma questão pessoal do atleta. Aqui o esporte é o meio e também mensagem. Ele ilustra a guerra fria de interesses do triângulo “amoroso”, a raiva, o tesão, a curiosidade, a parceria. A escolha do roteirista Justin Kuritzkes pelo tênis para transmitir o conflito direto e pessoal, o individualismo e a apreensão sem qualquer contato físico foi perfeitamente filmado com êxtase e muita criatividade por Guadagnino. E não existe o ponto de inflexão óbvio, a partida mais importante é esmiuçada durante toda o enredo sem perder o ritmo e finda com um ápice quase que sexual.

A química do elenco é mais um catalisador para o bom resultado. Zendaya, Mike e Josh têm boas cenas juntos, sozinhos, e em dupla (em todas as possibilidades de combinação possíveis), e se exibem com elegância e ao mesmo tempo com um furor e vontade presente até nos momentos mais introspectivos. Além disso, a pulsante trilha sonora, tanto a original conduzida por Trent Reznor e Atticus Ross quanto a curadoria musical inteligentemente aplicada, ajudam a colorir ainda mais o quadro geral.

O primor da trilha sonora, a química palpável do elenco e boa direção se materializam em harmonia numa belíssima cena sem qualquer diálogo, onde apenas uma versão cantada por Caetano Veloso do bolero “Pecado” consegue resumir todo a intenção do filme.

E que bom ter mais um filme sensual e sem culpa no cinema contemporâneo. Um dos artigos mais sagazes que li na internet pós-moderna foi um da autora Raquel S. Benedict publicado em 2021 intitulado “Everyone Is Beautiful and No One Is Horny” (Todo Mundo Está Bonito e Ninguém Está Excitado em tradução livre), em seu texto Raquel afirma que os filmes de heróis tiveram forte influência na “dessexualização” dos belíssimos corpos apresentados em cena.

Guadagnino, por outro lado, nunca fez questão de esconder a gana sexual e a lascívia inerentes à quase todos os seres humanos existentes. E Rivais tem nudez, tem beijos, tem olhares, tem carícias, tem atração sem tentar esconder ou minimizar o apetite, a tensão e obsessão. Talvez se os cortes excessivos e o jogo frenético de ângulos se limitassem apenas às cenas das partidas de tênis o longa ganhasse uma estrutura mais equilibrada, mas isso não chega a comprometer o acabamento, na verdade é até compreensível quando se chega a sentir a entusiasmo — para dizer o mínimo — que o cineasta teve ao filmar essa história.

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Written by Esse Eu Vi

Ávila Oliveira - Crítico de cinema desde 2012

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